Cabeça erguida, sem lágrimas, coração aberto, não olhe para atrás, afinal, novas possibilidades te esperam em qualquer esquina. Bastou virar alí, à direita, e pronto!
É... parece fácil executar o tal "seguir em frente".
Mas como apagar memórias tão ricas, tão vivas, tão latentes de tão longos anos?
Pior: como explicar para si mesmo que os tais planos que tanto sonhavam juntos não valem mais a partir de já? Aonde é que se colocam, depois de um fim mal decretado, os sentimentos nobres como a lealdade, o companheirismo, o amor?
Qual é o rumo que devemos tomar?
Dos outros eu não sei. Mas eu voltei pra casa, assim, sozinha, rasa de explicações e lotada de sentimentos, de dor, de dúvidas: como se mata um amor de um dia pro outro? E, se não havia mais amor, por que arrastar uma mentira por tanto tempo? Por que tantas desculpas, tão desencontradas, tão contraditórias?
E tem mais: quem faz isso geralmente se esquece de que as pessoas se falam, conversam entre si. Daí mentiras vêm à tona. E machucam mais e mais, e muito mais quem é, simplesmente, o alvo.
Chega a ser cruel.
Juro, me senti um touro derrubado numa arena de tourada depois de tudo o que vivenciei nesses últimos dias. Sangro alí, a céu aberto, exposta aso olhares de reprovação e de euforia de um público que se divide em torcer pelo touro e pelo toureiro.
Só que diferente do animal, eu não vou morrer fisicamente. A alma foi-se embora na penúltima madrugada, e meu corpo ficou aqui, com as dores e os danos morais que me proporcionaram.
E o seguir em frente tornou-se tarefa obrigatória.
Tentei me distrair o dia todo, fazendo de um sábado chuvoso o primeiro dia da minha nova história: fui ao supermercado, levei o Lucca ao pai dele, fui praticar meu credo, recebi um amigo querido e ainda saí com outra turma que é, sim, o meu porto seguro. E o melhor de tudo é que ninguém perguntou nada, ninguém fez menção ao ocorrido. Fui abraçada por todos e, como num pacto silencioso entre eles, todos se revezaram para me fazer sorrir.
Hoje acordei tarde, porém, um pouco mais leve do que ontem. Havia parado de chover e o Sol arriscava sair. Tive a certeza de que seguir em frente é meio instintivo.
Por isso, ontem guardei numa gaveta que quase nunca uso as fotos, os cartões, os mimos, bilhetinhos com juras de amor, guardei as jóias, a aliança - escolhida com tanto carinho por quem me queria tanto, há tão pouco tempo. Aliás, tirar a aliança da mão talvez tenha doido mais do que se eu perdesse um dedo.
Não consegui ainda apagar os emails com palavras sinceras, carinhosas, que me proporcionavam tanta segurança. Ao contrário: reli todos - absolutamente todos - para me certificar de que não estou louca, e que havia acontecido, de fato, até bem poucos dias atrás, uma história de amor.
Mas como tudo nessa vida um dia acaba (ou morre, como as flores de uma paineira, por exemplo, que cedem lugar ao real propósito da árvore), provavelmente seja esse o último grão a cair para germinar em mim o recomeço.
E que o seguir em frente seja, assim, abençoado.