quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Para Uma Menina Com Uma Flor


Porque talvez eu seja uma menina com uma flor (desabrochando em meu peito), eu amo tanto esse texto do Vinícius.


Porque talvez eu seja uma menina com uma flor (no caso duas, tatuadas no meu ombro direito), eu queira oferecer ao mundo meu melhor sorriso.


Porque talvez eu seja uma menina com uma flor (várias, na verdade) em minha alma, eu esteja sentindo tanto a falta de alguém importante.


Porque talvez eu seja uma menina com uma flor (vermelha, de paixão), eu sonhe com alguém recitando "Minha Namorada" para mim.


Porque talvez eu seja uma menina com uma flor (prestes a ser entregue a você), eu torça tanto para que seu jardim floresça rapido e eu possa, finalmente, criar raízes em seu terreno.


E porque talvez eu seja uma menina com uma flor, eu desejo tanto coisas que ainda nem vivi, mas que provavelmente saiba de cor (aquilo que minha intuição aponta) a alegria dos caminhos que virão.


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Para Uma Menina Com Uma Flor
Vinicius de Moraes


Porque você é uma menina com uma flor e tem uma voz que não sai, eu lhe prometo amor eterno, salvo se você bater pino, o que, aliás, você não vai nunca porque você acorda tarde, tem um ar recuado e gosta de brigadeiro: quero dizer, o doce feito com leite condensado.


E porque você é uma menina com uma flor e chorou na estação de Roma porque nossas malas seguiram sozinhas para Paris e você ficou morrendo de pena delas partindo assim no meio de todas aquelas malas estrangeiras.


E porque você sonha que eu estou passando você para trás, transfere sua d.d.c. para o meu cotidiano, e implica comigo o dia inteiro como se eu tivesse culpa de você ser assim tão subliminar. E porque quando você começou a gostar de mim procurava saber por todos os modos com que camisa esporte eu ia sair para fazer mimetismo de amor, se vestindo parecido. E porque você tem um rosto que está sempre um nicho, mesmo quando põe o cabelo para cima, parecendo uma santa moderna, e anda lento, e fala em 33 rotações mas sem ficar chata. E porque você é uma menina com uma flor, eu lhe predigo muitos anos de felicidade, pelo menos até eu ficar velho: mas só quando eu der uma paradinha marota para olhar para trás, aí você pode se mandar, eu compreendo.


E porque você é uma menina com uma flor e tem um andar de pajem medieval; e porque você quando canta nem um mosquito ouve a sua voz, e você desafina lindo e logo conserta, e às vezes acorda no meio da noite e fica cantando feito uma maluca. E porque você tem um ursinho chamado Nounouse e fala mal de mim para ele, e ele escuta e não concorda porque ele é muito meu chapa, e quando você se sente perdida e sozinha no mundo você se deita agarrada com ele e chora feito uma boba fazendo um bico deste tamanho. E porque você é uma menina que não pisca nunca e seus olhos foram feitos na primeira noite da Criação, e você é capaz de ficar me olhando horas. E porque você é uma menina que tem medo de ver a Cara-na-Vidraça, e quando eu olho você muito tempo você vai ficando nervosa até eu dizer que estou brincando.


E porque você é uma menina com uma flor e cativou meu coração e adora purê de batata, eu lhe peço que me sagre seu Constante e Fiel Cavalheiro.


E sendo você uma menina com uma flor, eu lhe peço também que nunca mais me deixe sozinho, como nesse último mês em Paris; fica tudo uma rua silenciosa e escura que não vai dar em lugar nenhum; os móveis ficam parados me olhando com pena; é um vazio tão grande que as mulheres nem ousam me amar porque dariam tudo para ter um poeta penando assim por elas, a mão no queixo, a perna cruzada triste e aquele olhar que não vê. E porque você é a única menina com uma flor que eu conheço, eu escrevi uma canção tão bonita para você, "Minha namorada", a fim de que, quando eu morrer, você, se por acaso não morrer também, fique deitadinha abraçada com Nounouse cantando sem voz aquele pedaço que eu digo que você tem de ser a estrela derradeira, minha amiga e companheira, no infinito de nós dois.


E já que você é uma menina com uma flor e eu estou vendo você subir agora - tão purinha entre as marias-sem-vergonha - a ladeira que traz ao nosso chalé, aqui nessas montanhas recortadas pela mão de Guignard; e o meu coração, como quando você me disse que me amava, põe-se a bater cada vez mais depressa.


E porque eu me levanto para recolher você no meu abraço, e o mato à nossa volta se faz murmuroso e se enche de vaga-lumes enquanto a noite desce com seus segredos, suas mortes, seus espantos - eu sei, ah, eu sei que o meu amor por você é feito de todos os amores que eu já tive, e você é a filha dileta de todas as mulheres que eu amei; e que todas as mulheres que eu amei, como tristes estátuas ao longo da aléia de um jardim noturno, foram passando você de mão em mão até mim, cuspindo no seu rosto e enfrentando a sua fronte de grinaldas; foram passando você até mim entre cantos, súplicas e vociferações - porque você é linda, porque você é meiga e sobretudo porque você é uma menina com uma flor.


quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Eu e o Lucca!!

Pra quem tinha curiosidade de conhecer o Lucca, aqui estão algumas fotos que eu adoro!!




























terça-feira, 28 de outubro de 2008

Não ouço, não vejo, não falo


Quem lembra daquela mítica figura dos três macaquinhos sentados: um tampando os ouvidos, o outro os olhos e o último, a boca? Eles fazem parte da tradição japonesa e ornamentam a entrada de um templo sagrado do século XVII, na cidade de Nikko. Eles são Mizaru, é o que cobre os olhos, Kikazaro, o que tapa os ouvidos e Iwazaru, o que tampa a boca. Além disso, representam o provérbio: não veja o mal, não ouça o mal e não fale o mal.

Porém, em dias atuais, também pode ser traduzida como "não vejo, não ouço e não falo" - na primeira pessoa mesmo - podendo ser aplicada para tudo, principalmente nos relacionamentos. Afetivos, é claro.

O fato é que tenho percebido um certo movimento "autista" por parte de algumas pessoas e até mesmo de casais. Essa turma passou a viver num universo paralelo, num Second Life, sei lá, se recusando a encarar a realidade. É a tal cegueira das circunstâncias, que já mencionei aqui outras tantas vezes. É a mesma coisa.

O que me incomoda nisso tudo é que responsabilidades estão sendo deixadas de lado: ninguém ouve ninguém, não há diálogo e, por fim, ninguém mais se enxerga. Depois reclamam de seus parceiros, reclamam de não ter ninguém pra dividir a vida, a chatice dos dias corridos ou o colorido de um alvorecer.

Na cabeça dessas pessoas o que importa é o agora, o "meu": meu trabalho, minha vontade, minhas necessidades, minha vida. Meu mundo. Aliás, o mantra é "eu e meu mundo". Egoísmo puro. Bobagem.

O duro é que amanhã ou depois essas pessoas talvez percebam o tempo que perderam girando em torno de seu próprio umbigo. Vai faltar história, memória ou qualquer coisa de valor pra contar, ou para ter pra si próprio. Não existirão lembranças de porres com amigos ou conversas lamuriosas por causa de uma moça, nem um papo que tenha marcado, que tenha feito mudar o caminho ou rever conceitos.

Ou talvez nunca mudem e vivam achando que seu mundinho é perfeito (ou impenetrável, vai saber) e que os outros gastam tempo demais com os outros. Aliás, essa é a chave! Falta disposição para ter preocupações alheias.

Por causa da máxima "cada um com seus problemas" estamos ficando distantes uns dos outros. Aos poucos, as pessoas estão perdendo o timming do diálogo, o jeito de ouvir e a graça do olhar.

Uma pena... Porque eu, dentro do meu mundo (que é vasto e tem espaço pra todos), continuo com bons e velhos hábitos:


  • de dar bom dia, desejando que seja realmente bom.

  • de ouvir quando alguém fala comigo e dar atenção a isso.

  • de ver o mundo com olhos alegres e o coração carregado de esperança.

Eu ouço, eu vejo e eu falo!!


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Beijo a todos que têm visitado meu espaço e obrigada pelos comentários e elogios!!





segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Sobre deveres, direitos e vitórias


Não votei ontem.

Abri mão do meu dever cívico e de cidadã paulistana para um motivo maior.

Fui para o litoral e descansei. Tinha esse direito, afinal.

Aproveitei para dormir, para descansar, para ficar com meu filho. Tirei a cabeça da órbita escritório-casa-escritório.

Cozinhei, ouvi o silêncio, escutei o bem-te-vi, o sabiá e muito rock´n´roll. Tinha essa obrigação.

Joguei damas com meu filho. Ganhei duas vezes e perdi outras duas para ganhar o sorriso mais lindo do mundo. Dever de mãe, de amiga. Obrigação de quem ama.

No sábado eu e o Lucca tomamos chuva, compramos figurinhas e comemos tapioca. Juntos. Como dois grandes amigos.

À noite comemos pizza, assistimos TV e adormecemos abraçados - exatamente como um grande amor faria - direitos de apaixonados.

No domingo amanhecemos com um sabiá cantando e um Sol que veio de presente para coroar nosso passeio.

Decidimos não ir embora para votar. Direito nosso querer prolongar a estada para ficar mais tempo juntos.

Fomos à praia, tomamos sorvete, andamos pela beira do mar - exatamente como cúmplices e companheiros fariam.

Daí veio um pedido - ele queria que eu alugasse uma bicicleta para ele.

Na hora titubiei porque, como ele não tem bicicleta, talvez não soubesse andar.

Nessa hora o dever de mãe bateu mais forte ainda. Meu filho precisava alí de um apoio. E eu não estou me referindo às rodinhas laterais da bicicleta. Era meu consentimento, minha aprovação.

E lá fomos nós.

Uma hora de locação custou R$5,00. Porém, a recompensa de ver o Lucca se divertindo e pedalando na areia foi imensa. Exatos 60 minutos de alegria, liberdade, independência e superação.

Ele venceu seu próprio desafio.

E eu ganhei meu domingo.

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Delícia!


Ela finalmente encontrara alguém.


Ok, não era exatamente o que ela sonhava, mas era alguém que conseguiu estremecer suas estruturas.


Ele era chef de cozinha, dono de um pequeno bistrô, e ela, uma artista plástica cheia de sensibilidade e que, pela primeira vez, estava experimentando o gosto do negócio próprio.
Uma amiga havia indicado o restaurante a ela e sugerido um prato específico. E ela foi, despretensiosamente, provar o prato naquele mesmo dia.


Coisa simples, mas muito bem feita, pensou enquanto degustava a iguaria. O ambiente também era simples, porém, sem ser simplório. A rusticidade chegava a ser chique e, ao mesmo tempo, conferia um toque aconchegante àquele espaço. "Uma delícia", assim definia para os amigos.


Gostou dali e passou a freqüentar sempre que sentia necessidade de ser acolhida. A comida, o serviço e o ambiente bastavam. Acontece que a curiosidade foi chegando e ela queria saber quem era o dono daquilo tudo porque, de certa forma, já estava se apaixonando pelo lugar.


Até que um dia eles se conheceram, conversaram rapidamente e ela indicou seu endereço eletrônico para que ele conhecesse seu trabalho. Ele gostou do que viu.


A partir daquele dia passaram a se corresponder por email – ela elogiando os pratos e suas criações e ele comentando como era realmente bom o trabalho dela.


Acontece que começou a sentir uma coisa estranha, uma confusão qualquer, mas, acima de tudo, uma vontade louca de estar com ele todos os dias. Via nele uma espécie de personagem fatal, desses que qualquer mulher cairia na hora. E ela caiu.


Ela não sabia quase nada dele: supunha que não tivesse compromisso com ninguém, afinal ele nunca comentara, sabia ser um amante de artes, música, bons vinhos, além, é claro, de ser um excelente chef de cozinha.


Mas o pior de tudo é que, por mais que ela se esforçasse para tentar uma aproximação maior, nunca sentia firmeza naquele terreno. Não sabia como pisar, como chegar ou encantar o moço. E outra: ele sequer fazia o tipo dela!! Mas como nas coisas do coração ninguém manda, nem explica, ela continuou na espera de ser notada. E sonhava acordada com isso.


Ele, por sua vez, apenas continuava elogiando seus trabalhos e isso passou a ser sinônimo de ansiedade para ela. A cada novidade que colocava na web, vivia uma espera alucinada por um email, um retorno, uma gentileza, uma delicadeza. E isso, quando vinha, causava nela uma onda de mil sentimentos – um mix de tesão, recompensa, reconhecimento, desejo. Cada elogio era quase um orgasmo, guardadas as devidas proporções, é claro.


É... ela precisava ser desejada. Precisava ser tomada, ser pega, ser engolida por ele.


Por várias vezes, à noite, antes de dormir, se tocava pensando nele e ia à loucura. Imaginava seus beijos, seus carinhos, a força de suas mãos, o toque em seus cabelos. Pensava em como seria ele descobrindo seu corpo, percorrendo com sua boca todas as suas curvas. Também pensava em como seria bom dar a ele o mesmo e daí a imaginação ia longe. Boas eram as noites em que se tinha um elogio para acompanhar suas fantasias.


E enquanto isso não se tornava realidade, ela seguiu aprimorando seu trabalho, a espera de um dia, quem sabe, seus orgasmos deixarem de ser virtuais e ela poder, de fato, dar o melhor a ele, que merecia tanto.

Algumas curvas

"A linha da vida fica muito mais interessante quando ganha algumas curvas."
(Oscar Niemeyer)









terça-feira, 21 de outubro de 2008

Amélia New Generation


Tenho horror a feministas.


Penso que essa "tribo" já deu o que tinha que dar.


Concordo que o movimento foi muito importante para o posicionamento da mulher em toda a sociedade. Graças a ele, hoje votamos, trabalhamos, temos opinião própria e podemos expressar nossa vontade. Toda essa luta também nos trouxe outros benefícios, afinal, nos tornamos independentes e livres. Porém, me pergunto todos os dias se valeu a pena queimar o sutiã em praça pública.


O resultado de toda essa revolução culminou num caminho de difícil retorno: as mulheres livres e independentes estão ficando sozinhas. E amargas.


É... com tudo isso aprendemos coisas que antigamente eram exclusivas dos homens e hoje trocamos pneus, resistência de chuveiro, abrimos vidro de palmito, discutimos com o mecânico, paqueramos mesmo... e aí a coisa pega forte. Algumas mulheres trocaram realmente de posição e passaram a "caçar" os homens como se eles fossem o sexo frágil. Daí jogaram uma pá de cal em todo o romantismo. Acabaram com detalhes que fazem toda a diferença e agora ficam chorando a falta de alguém especial.


Desculpem as mais "engajadas", mas tenho uma alma de Amélia New Generation. Ainda assim eu sou uma mulher de verdade! Gosto de cuidar da minha casa, gosto de cuidar de filho, namorado, e gosto muito de me cuidar. Adoro cozinhar, sei passar roupas, arrumar a casa, trabalho fora, encaro dupla jornada. A diferença é que eu tenho vaidade e amor-próprio, ao contrário da personagem da música de Mario Lago e Ataulfo Alves.


Por isso, ao ver mulheres jovens lastimando não encontrar um parceiro bacana, juro que penso em pedir para que ouçam mais suas mães, tias e avós, e apreendam certos conselhos ao invés de se vangloriarem por serem livres e independentes!! Essas mulheres usam as benesses da vida moderna de forma pejorativa e acabam invertendo os papéis. Excedem e pecam, ao mesmo tempo, nas atitudes. Daí se tornam infelizes e culpam os outros pelo preço que pagam por suas escolhas.


Meninas, aprendam que certas coisas foram feitas para serem usadas para sempre. Uma delas é a gentileza e a outra sutileza. Não vivemos mais em tempos de lencinhos jogados no chão, porém convenhamos, nada como um homem que abre a porta do carro e oferece a mão, puxa a cadeira para sentarmos e ainda por cima abre vidros de palmitos e sabe utilizar um saca-rolhas com maestria. E tudo isso graças à sutileza de nossas ações!


OBS: eu não queimei o sutiã!!



segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Não sou estatística


Há uns seis anos atrás, conheci um moço dez anos mais velho do que eu. Ficamos enamorados um pelo outro em poucos dias de convivência, afinal, estávamos trabalhando juntos em um projeto. Demorou cerca de um mês para engatarmos um namoro.
A princípio ele era o que toda mulher sonha: atencioso, solteiro, carinhoso, presente. Em resumo, um lord.
Porém, o moço não tinha trabalho fixo e bebia muito e, como conseqüência, tinha terríveis ataques de ciúmes. Mas, passado o porre, ele voltava a ser o mesmo moço bonzinho, capaz de ninar um recém-nascido ou se emocionar com uma música clássica.
E assim o tempo foi passando e ele ficando cada vez mais insano: passou a ligar na minha casa de madrugada para saber se eu estava lá, não podia mais deixar meu celular desligado um minuto porque ele achava que eu estava fazendo alguma coisa errada, me seguia, botou gente de dentro do meu escritório para me vigiar e conseguiu minhas senhas de emails e orkut para monitorar meus relacionamentos. Sem contar que arrumava briga em qualquer lugar, com qualquer pessoa.
Até o dia em que eu não quis mais passar por situações constragedoras, nem ser ameçada. Sumi por um fim de semana e, na segunda-feira, depois de muito insistir, fui encontrá-lo para dizer que não queria mais nada e que cada seguisse seu caminho. O local era o mais inocente possível e, ao mesmo tempo, aparentemente seguro: o estacionamento de um supermercado de bairro, ao lado de um McDonalds e de uma Blockbuster.
O resultado só não foi pior porque consegui fugir. Ao ouvir que eu não queria mais nada com ele, que estava cansada daquela loucura, das bebedeiras, da falta de trabalho dele, o moço passou a me bater. E bateu tanto que tive descolamento do couro cabeludo na parte de trás da cabeça, próximo à nuca.
Com requintes de crueldade, ele segurava meus cabelos e batia minha testa no volante do meu carro. Quando parava, cuspia no meu rosto e me ofendia com os mais diversos palavrões. E eu pedindo que ele parasse com aquilo, que eu voltaria, que eu estava arrependida. Detalhe: ele não bateu no meu rosto uma vez, mas minhas costas e costelas ficaram completamente roxas, doloridas. O galo na testa era enorme. Por um "descuido", bateu minha boca no volante e meu lábio sangrou. Nesse momento consegui fugir do carro e, com o celular nas mãos, saí correndo e liguei para a polícia.
O atendimento foi péssimo. A pessoa do outro lado da linha queria saber a numeração da avenida que eu estava, queria saber se o outro estava alcoolizado, queria saber se eu poderia voltar para o supermercado enquanto uma viatura viria ao meu socorro. E isso poderia demorar uns 10 minutos. Detalhe²: o infeliz estava vindo atrás de mim enquanto eu falava com a polícia. Quando ele me alcançou, jogou me celular do outro lado da avenida e foi embora.
Detalhe ³: as pessoas que estavam no estacionamento e viram tudo isso nada fizeram para me ajudar, talvez, se apoiando na máxima "em briga de marido e mulher, ninguém mete a colher".
Me certifiquei de que ele não estava mais por perto, peguei o que sobrou do celular e voltei para o carro. Quando saí do estacionamento, vi um posto móvel da polícia perto dali - uns 100 metros - e me dirigi para lá.
Para minha surpresa, após contar o que havia acontecido, ouvi do policial que eu era estatística e que como eu, mais de uma centena de mulheres estavam apanhando naquele momento e, por fim, que quase 100% delas voltariam para o agressor no dia seguinte.
Fui embora sem prestar queixa, arrasada, envergonhada, me sentindo suja e muito triste.
As agressões continuaram por alguns meses, mas o assédio era moral: emails para meus amigos, scraps pornográficos e ofensivos, montagem de fotos com a minha imagem.
Levou algum tempo, mas eu tive coragem e fui denunciá-lo numa delegacia para mulheres. Fui recebida com todo respeito, me deram atenção, ouviram minha história, consideraram minhas provas e daí entraram com um processo de perturbação da tranquilidade e ofensa moral, porque a agressão física tinha acontecido uns meses antes.
Me senti gente, me senti forte, íntegra. Mais ainda quando ele foi formalmente citado e depois processado.
Na verdade, não deu em nada. Doou algumas cestas básicas e algumas horas de serviços à comunidade. E nunca mais me procurou. Ele talvez tenha aprendido a lição, mas não sei se sabe lidar com um grande e sonoro NÃO.
Daquele leão enfurecido, sobrou um gatinho manso. E aquela mulher agredida virou uma leoa e não se transformou em estatística.
Eu sobrevivi.


Eloá, descanse em paz.

domingo, 19 de outubro de 2008

Pra não entender

Veio desde a cozinha até o quarto apagando as luzes, recolhendo roupas jogadas e objetos que estavam fora do lugar. Pensou em pendurar uma placa avisando que "objetos inanimados não se movem sozinhos" para ver se surtiria algum efeito, mas estava tão cansada que teve forças apenas para escovar os dentes e deitar.
Olhou para o lado e ele dormia profundamente.
Com um gesto de aparente carinho passou as mãos nas costas dele esperando alguma reação. Nada. Tentou se encostar de leve, envolvendo o corpo dele com pernas e braços. Nada de novo.
Suspirou e foi para sua posição de sempre, virada para o lado esquerdo. Estava muito cansada, mas não tinha nem um pingo de sono. Teve frio, teve calor, teve vontade de acordá-lo. Mas não fez nada porque um pensamento acabara de invadir sua noite.
Foi tirando vagarosamente seu pijama - primeiro a calça, as meias, tirou sua blusa e assim ficou por um minuto.
Passou delicadamente a mão pelo colo, desceu até a barriga, tocou suas coxas. Se demorou em carinhos, se perdeu em detalhes.
Suspirava baixinho a cada descoberta e, com a memória a postos, ousou toques, sentiu gostos e, por fim, sufocou um gemido.
Passado o êxtase, certificou-se de que ele não havia percebido nada, vestiu-se novamente e o sono chegou logo. Dormiu como um anjo.
No dia seguinte ele acordou com alguém assobiando, cheiro de café e pão fresco na mesa. Viu a sala arrumada e, como não compreendeu a situação, pensou: "quem entende as mulheres?".

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Exemplo

Exemplo (by Rafa Cury):

(...) Pouco importa quem merece o quê. Ofereço carinho. Devolvem-me pedras. Estou errado? Negativo, errado é quem me atira. (...)

Não é preciso dizer mais nada.

O princípio do vazio


Depois de confessar aqui que tudo o que preciso é amor, que vou refazer meu jardim e que vou cuidar mais de mim, fiquei pensando em uma coisa: o que virá quando tudo isso estiver pronto.

Sou o tipo de pessoa que precisa estar constantemente apaixonada para ser feliz. Apaixonada pela vida, pelo trabalho, pelas pessoas, por alguém especial.

Porém, ultimamente, tirando o amor pelo meu filho e pelos meus amigos, tenho me sentido meio vazia.

Parece que houve uma mudança dentro de mim: os móveis já não estão mais no lugar, há muito espaço e algum eco. Aliás, ainda ecoam vozes de coisas que não foram embora, e que já não pertencem mais a esse lugar, mas que insistem em ficar.

Mesmo assim me sinto vazia.

E a princípio isso soou de forma depressiva. Fiquei triste porque coisas caras haviam sido despejadas de dentro de mim, sem a minha autorização. Coisas importantes foram embora e só ficou a saudade e a memória que insistem em habitar esse espaço vazio.

A tristeza ainda está saindo junto com a mudança. Mas isso um dia acaba.

Por outro lado, estar vazia é uma excelente oportunidade de dar sentindo à minha história. A partir do momento em que eu me certificar de que não há mais nada do antigo inquilino, poderei locar novamente esse espaço tão privilegiado que é meu coração. E assim, preencher com novo mobiliário e criar um ambiente aconchegante e acolhedor.



terça-feira, 14 de outubro de 2008

Aforismos sem juízo

por Daniel Piza (do Estadão):

A solidão não purifica. A cartarse não salva. Quem acredita demais num ideal está pronto para não realizá-lo.

Para um amigo


essa vai para um amigo:


"A alegria de fazer o bem é a única felicidade verdadeira."

[Tolstoi]


Obrigada por compartilhar sua história comigo!!

Tenha a certeza de que você ganhou mil sorrisos "musicais" (inclusive o meu!).

Beijos,


Andréa

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Um pouquinho mais feliz


Hoje acordei muito cedo. Ainda não era cinco da manhã (acho que faltava uns dez minutos), estava começando a clarear. O dia nascia rapidamente junto com um Sol imenso e toda a sua energia.

Meu compromisso era levar e acompanhar minha avó, a vó Nora, para uma consulta médica às 7 horas. Consulta de rotina para ver os resultados dos exames. Posso dizer que ela deve estar melhor do eu porque, segundo a médica, ela tem "exames de mocinha" para quem tem 84 anos, se referindo à normalidade dos resultados.

Mas antes, quando o posto de saúde ainda nem havia aberto as portas (às 6h30), fiquei observando o dia, o hoje. E juro, me senti um pouquinho mais feliz. Tinha um sabiá, tinha uns pardais, tinha uma árvore que fazia um pouco de sombra. Tinham os raios do sol por entre os galhos. Tinha vida. E, claro, tinha esperança.

Não sei, mas tive a impressão de que tudo aquilo era pra mim.

E se foi, só posso dizer uma coisa: OBRIGADA! Hoje eu fiquei um pouquinho mais feliz.

domingo, 12 de outubro de 2008

Todo Se Transforma

Nessa fase de tanta mudança, transformação e descoberta, estou criando uma trilha sonora pra musicar minha história.
E pra começar, vamos de Jorge Drexler, com Todo se Transforma.
O refrão diz tudo... "nada é mais simples, não há outra norma: nada se perde tudo se transforma!".

Todo Se Transforma

Tu beso se hizo calor,
luego el calor, movimiento,
luego gota de sudor
que se hizo vapor, luego viento
que en un rincón de La Rioja
movió el aspa de un molino
mientras se pisaba el vino
que bebió tu boca roja.

Tu boca roja en la mía,
la copa que gira en mi mano,
y mientras el vino caía
supe que de algún lejano
rincón de otra galaxia,
el amor que me darías,
transformado, volvería
un día a darte las gracias.

Cada uno da lo que recibe
y luego recibe lo que da,
nada es más simple,
no hay otra norma:
nada se pierde,
todo se transforma.

El vino que pagué yo,
con aquel euro italiano
que había estado en un vagón
antes de estar en mi mano,
y antes de eso en Torino,
y antes de Torino, en Prato,
donde hicieron mi zapato
sobre el que caería el vino.

Zapato que en unas horas
buscaré bajo tu cama
con las luces de la aurora,
junto a tus sandalias planas
que compraste aquella vez
en Salvador de Bahía,
donde a otro diste el amor
que hoy yo te devolvería...

Cada uno da lo que recibe
y luego recibe lo que da,
nada es más simple,
no hay otra norma:
nada se pierde,
todo se transforma.

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Meu jardim

Recentemente li um texto lindo, escrito por uma pessoa igualmente linda, sobre metamorfoses da nossa vida. O autor abria o texto com a seguinte frase do Rubem Alves: "Não haverá borboletas se a vida não passar por longas e silenciosas metamorfoses."
E, como as borboletas só aparecem em jardins bonitos e felizes, tratei de olhar pro meu terreno e ver o que anda afastando as minhas borboletas.
Acabei encontrando algumas ervas daninhas e nenhuma flor. Estava tudo murcho, ressecado, quase morto.
Que decepção... Logo eu, que sempre fui tão cuidadosa com jardins alheios, dexei o meu ficar nesse estado. Parace um latifundio improdutivo. Nenhum inseto iria procurar guarida ali: nem joaninhas, formigas, abelhas, vespas, maria-fedida e muito menos borboletas.
Passarinhos então... nem pensar!
Por isso, hoje resolvi mudar essa paisagem. Porque o Sol apareceu, porque é primavera e porque percebi que abandonei meus sonhos pra cuidar dos jardins dos outros.
Hoje vou arar meu terreno, afofar minha terra, tirar as ervas daninhas. Vou deixar tudo bonito de novo, para que as borboletas se aproximem e para que os passarinhos voltem a cantar em minha janela. Dessa vez pra sempre!!

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Jardim
(por Rubem Alves)

(...)
Depois de uma longa espera consegui, finalmente, plantar o meu jardim. Tive de esperar muito tempo porque jardins precisam de terra para existir. Mas a terra eu não tinha. De meu, eu só tinha o sonho. Sei que é nos sonhos que os jardins existem, antes de existirem do lado de fora. Um jardim é um sonho que virou realidade, revelação de nossa verdade interior escondida, a alma nua se oferecendo ao deleite dos outros, sem vergonha alguma... Mas os sonhos, sendo coisas belas, são coisas fracas. Sozinhos, eles nada podem fazer: pássaros sem asas... São como as canções, que nada são até que alguém as cante; como as sementes, dentro dos pacotinhos, à espera de alguém que as liberte e as plante na terra. Os sonhos viviam dentro de mim. Eram posse minha. Mas a terra não me pertencia.

O terreno ficava ao lado da minha casa, apertada, sem espaço, entre muros. Era baldio, cheio de lixo, mato, espinhos, garrafas quebradas, latas enferrujadas, lugar onde moravam assustadoras ratazanas que, vez por outra, nos visitavam. Quando o sonho apertava eu encostava a escada no muro e ficava espiando.

Eu não acreditava que meu sonho pudesse ser realizado. E até andei procurando uma outra casa para onde me mudar, pois constava que outros tinham planos diferentes para aquele terreno onde viviam os meus sonhos. E se o sonho dos outros se realizasse, eu ficaria como pássaro engaiolado, espremido entre dois muros, condenado à infelicidade.

O terreno ficava ao lado da minha casa, apertada, sem espaço, entre muros. Era baldio, cheio de lixo, mato, espinhos, garrafas quebradas, latas enferrujadas, lugar onde moravam assustadoras ratazanas que, vez por outra, nos visitavam. Quando o sonho apertava eu encostava a escada no muro e ficava espiando.

Eu não acreditava que meu sonho pudesse ser realizado. E até andei procurando uma outra casa para onde me mudar, pois constava que outros tinham planos diferentes para aquele terreno onde viviam os meus sonhos. E se o sonho dos outros se realizasse, eu ficaria como pássaro engaiolado, espremido entre dois muros, condenado à infelicidade.

Mas um dia o inesperado aconteceu. O terreno ficou meu. O meu sonho fez amor com a terra e o jardim nasceu.

Não chamei paisagista. Paisagistas são especialistas em jardins bonitos. Mas não era isto que eu queria. Queria um jardim que falasse. Pois você não sabe que os jardins falam? Quem diz isto é o Guimarães Rosa: "São muitos e milhões de jardins, e todos os jardins se falam. Os pássaros dos ventos do céu - constantes trazem recados. Você ainda não sabe. Sempre à beira do mais belo. Este é o Jardim da Evanira. Pode haver, no mesmo agora, outro, um grande jardim com meninas. Onde uma Meninazinha, banguelinha, brinca de se fazer Fada... Um dia você terá saudades... Vocês, então, saberão..." É preciso ter saudades para saber. Somente quem tem saudades entende os recados dos jardins. Não chamei um paisagista porque, por competente que fosse, ele não podia ouvir os recados que eu ouvia. As saudades dele não eram as saudades minhas. Até que ele poderia fazer um jardim mais bonito que o meu. Paisagistas são especialistas em estética: tomam as cores e as formas e constróem cenários com as plantas no espaço exterior. A natureza revela então a sua exuberância num desperdício que transborda em variações que não se esgotam nunca, em perfumes que penetram o corpo por canais invisíveis, em ruídos de fontes ou folhas... O jardim é um agrado no corpo. Nele a natureza se revela amante... E como é bom!

Mas não era bem isto que eu queria. Queria o jardim dos meus sonhos, aquele que existia dentro de mim como saudade. O que eu buscava não era a estética dos espaços de fora; era a poética dos espaços de dentro. Eu queria fazer ressuscitar o encanto de jardins passados, de felicidades perdidas, de alegrias já idas. Em busca do tempo perdido... Uma pessoa, comentando este meu jeito de ser, escreveu: "Coitado do Rubem! Ficou melancólico. Dele não mais se pode esperar coisa alguma..." Não entendeu. Pois melancolia é justamente o oposto: ficar chorando as alegrias perdidas, num luto permanente, sem a esperança de que elas possam ser de novo criadas. Aceitar como palavra final o veredicto da realidade, do terreno baldio, do deserto. Saudade é a dor que se sente quando se percebe a distância que existe entre o sonho e a realidade. Mais do que isto: é compreender que a felicidade só voltará quando a realidade for transformada pelo sonho, quando o sonho se transformar em realidade. Entendem agora por que um paisagista seria inútil? Para fazer o meu jardim ele teria que ser capaz de sonhar os meus sonhos...


quinta-feira, 9 de outubro de 2008

SAFADA

Não dormi quase nada de ontem pra hoje. Resultado: tô um caco, com umas olheiras "daquelas" boas...
Também não estou conseguindo me concentrar no trabalho.
Para espantar o sono, entre um bocejo e outro, fui fazer a ronda nos meus blogs preferidos e parei no do Fabrício Carpinejar, que lançou recentemente um livro chamado "Canalha". O livro surpreende a começar pelo nome, mas como o próprio autor explica, não se trata de uma ofensa, e sim, de um grau de evolução do homem. "O canalha. Como um elogio. Um elogio para dizer que é impossível domesticar esse homem, é impossível conter, é impossível fugir dele. (...) Estou falando do canalha que suscita aproximação, abraço, desejo".
Daí, após o lançamento do livro (que eu ainda não comprei!!!), surgiu uma discussão. Qual seria o feminino do canalha??
A resposta está abaixo, num texto delicioso.
E, já que o Fabrício batizou, vou me despedir assim...

Beijos da SAFADA!!









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O EQUIVALENTE FEMININO DE CANALHA



Põe tarja rosa no lugar da preta.
Canalha tem um equivalente. Mais delicioso do que ele.
Se eu fico eriçado com Canalha, nem posso pronunciar direito seu sinônimo feminino. Transborda. É como, imobilizado, ser acariciado pelas pernas de uma mulher e investir inutilmente as mãos nas cordas.
Vou guardar para o final.
Os leitores debateram qual seria a encarnação depilada do canalha.
Surgiram várias provocações.
“Ingrata”? Elimino. Há uma ancestralidade negativa, não tem peso sexual. Atende a situações de desapego e desprezo. Ingrata é quem não dá o merecido.
Convenhamos, o canalha dá mais do que o merecido. Só não permanece. Some sem se despedir. Canalha nunca aparece morto, um dia pode voltar. É o Dom Sebastião do sexo. Os telefonemas vão rareando e, de repente, ressurge como se fosse ontem, disposto como da primeira vez.
O canalha sofre ataques de ternura. Nunca alcançamos o quanto ele vai durar - o que aumenta a intensidade dos encontros.
"Você é uma ingrata" soa como briga de comadres. Ou algo que o cabeleireiro confessa quando você não gosta da franjinha que ele inventou de última hora.
“Ordinária”? Um arcaísmo. Já era velho com Nelson Rodrigues. Não tem modernidade. Significa o cafajeste de saias. Sem diploma, não tem o cacife de um canalha. Foi trabalhar muito cedo.
Forte, contundente, mas clamor despossuído de continuidade. É empregado para qualificar as sessões nas Câmaras Municipais de Vereadores, o que liquida de vez sua prosperidade amorosa.
Ordinária não oferece esperança. Canalha tortura pela fé depois de torturar pelo amor.
"Você é uma ordinária" lembra despedida de novela mexicana dublada. Os lábios do ator fecharam e a ordinária nem terminou de sair da garganta. Conclusiva, trai a mímica. Um beco da linguagem.
Para expulsar uma amante e se internar em seguida numa clínica de desintoxicação.
"Vaca"? Não, é um complemento sexual. Um vibrador das palavras, não tem a regularidade da carne. Um apelo que pode ser usado de modo controlado. No ardor dos travesseiros. Aliás, um gemido abafado no travesseiro é a soberba do som. Um gemido sufocado é o mais alto gemido que o homem pode ouvir de uma mulher. Nossos orgasmos serão sempre surdos depois dele.
Você é uma vaca" não tolera a repetição. Vaca Vaca Vaca é arremate de leilão na tevê. Se a protagonista é peituda, sério risco de sofrer um processo por difamação.
O mesmo com as demais espécies. “Cadela” ou “Égua” dependem de uma oportunidade. São adicionais da investida. Deve deixar a mulher pedir. O apetite rural é conseqüência dos bons antecedentes urbanos da transa.
"Vadia"? Funciona unicamente no quarto. Na rua, será motivo de agressão.
"Ei, vadia, está furando a fila?" Não surte efeito.
O canalha é o coringa do charme, pode ser veiculado nas vias públicas e acessos íntimos.
"Ei, canalha, está furando a fila?" Ainda se manterá a normalidade do trânsito.
Vadia exige intimidade ou tesão descomunal.
Desembarcamos no ponto alto: se o canalha fosse mulher, seria SA-FA-DA. É o café cortado que faz par ao expresso. A pronúncia é igual. Aberta, com as vogais batendo três vezes nos dentes. Safada é o vodu da dicção. Alfineta a boca. Estala, como aldrava numa porta.
Quando o homem fala SAFADA, tem dificuldade para terminar. É derrotado pelo prazer. Prolonga ao máximo, como um guizo de uma cascavel. Depois de verbalizar, sente imediatamente uma saudade sonora.
Safada é expressão para morder, por mais que se queira lambê-la. Pode ser disparada no cantinho de trabalho ou numa roda de samba. É um elogio da malícia feminina, reconhecimento ao incontrolável temperamento. Com "sua" na frente é AVC. Não há como negociar prazos.
Repare: Sua Safada. O pulmão pede passagem. Mais consagração do que ofensa. Picardia na medida certa. Melodia que insinua e não limita o delírio.
Um sujeito somente diz quando reconhece que está sendo derrubado e nunca gostou tanto de ser masoquista. “Safada” é gritado como canalha. Ainda que num sussurro, ultrapassa o limite de 60 decibéis e deflagra a poluição sonora.
É um "não esperava" esperando. O cara restará idiota, com o rosto perplexo de quem pensa "nos conhecemos de algum lugar?" e não estraga o momento com essa pergunta. Traz uma autoridade milenar, um conhecimento secreto que não merecer ser revelado, muito menos questionado.
Safada é libertinagem ingênua, devassidão castiça. Safada é o que o homem encontrou para não entregar que está apaixonado.
Tente.

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Não vem ao caso


Acordou se sentindo estranha.

Tinha uma ansiedade, uma inquietação estranha.

Por mais que fosse elétrica, ou ligada nos 220 volts, como seus amigos falavam, ela estava se achando estranha.

Foi pro chuveiro e providenciou uma ducha fria. Mas se demorou por lá. A esponja cheia de espuma trouxe uma sensação estranha, um arrepio. "Deve ser a água fria", pensou. Tocar-se foi um ato tenso alí - mesmo que fosse apenas para o dever do banho.

Colocou um vestido, um sapato que combinava com a bolsa, fez uma maquiagem rápida e foi trabalhar.

Passou o dia todo com aquele arrepio percorrendo seu corpo.

Começou a ficar intrigada e, claro, a resposta veio rapidamente. Havia terminado um relacionamento de longa data e há muito estava sozinha. Tinha se esquecido de como eram certas sensações, necessidades. Aquilo era seu corpo e sua alma clamando por uma série de "pecados", algumas luxúrias e certas aventuras.

O dia passou voando e ela saiu com suas amigas. Era sexta-feira, a noite estava bonita, calor da primavera. Alguns choppinhos e ela ficou mais solta, sorridente. O álcool libertava sua alma naquele instante e ela virou a cabeça e viu alguém que não via há muito tempo.

Olhares se cruzaram, sorrisos, acenos e dois minutos depois estavam se abraçando, dizendo "ah! quanto tempo!", "você sumiu, não ligou mais", "não... foi você que começou a namorar". Sorriram calados e o arrepio lhe percorreu novamente o corpo. Dessa vez com mais intensidade.

Meia hora depois despediu-se das amigas e passou na mesa do moço para dar boa noite. Dez minutos depois ele estava no carro dela.

Olhos nos olhos, beijo de tirar o fôlego. Quase se engoliram ali. O arrepio insistindo e aumentando cada vez mais. Foram para a casa dela e o elevador quase presencia o ato.

Entraram se agarrando, se beijando, como se aquela fosse a última noite, a última vez.

Roupas pelo corredor, beijos por todo o corpo. A voz dele ao pé do ouvido lhe causava calafrios, a barba na nuca fazia com que ela se contorcesse toda como uma ginasta e, ao mesmo tempo relaxasse e se entregasse.

A luz estava acesa e ele pode redescobrir todos os caminhos dela - pernas, coxas, virilha. Subiu pela barriga e parou para ouvir o coração acelerado, batendo num ritmo de quero mais, ao mesmo tempo em que ele lhe acariciava o seio. Depois ele ainda a tomou de várias formas, com várias intensidades.

E ela teve mais. Muito mais. Calafrios, arrepios, gozo e gargalhadas. Ria de si mesma, ria de prazer. Por que mesmo ela havia se fechado? Naquele momento nem se lembrava mais. Isso também não vinha ao caso. O que importava ali era saciar suas necessidades.

Ao término da aventura, se despediram e ele pediu "me liga amanhã". Ela disse que sim, claro, iria ligar, deu o último beijo e foi para o mesmo chuveiro da manhã. Enquanto a esponja apontava a sensilibilidade daquela pele que havia sido tocada há minutos atrás, lembrou-se de que não havia anotado o telefone dele. Não se importou. Aquilo, agora, não vinha mais ao caso.



terça-feira, 7 de outubro de 2008

All we need is love


Acabei de ler a seguinte frase:

"Tudo o que você precisa é de amor. Mas um pouco de chocolate agora e depois não faz mal." , escrita pelo 'pai' do Snoopy, o cartunista Charles Schulz.


Tudo a ver comigo hoje... Aliás, como disse um amigo meu logo após uma dolorosa separação, "estou tão triste que choro ao ver cachorro lambendo poça". Faço minhas as palavras dele.


Aliás, quero deixar registrado aqui como me tornei 'ridícula' nesses últimos dias. A pessoa na fossa não é digna de pena e sim, de sarro!! Tudo me emociona, me toca e daí eu choro. Choro no trânsito ouvindo uma música brega, choro ao ver os pássarinhos de manhã, choro antes de dormir. Simplesmente choro.


E nessas horas o Universo conspira contra mesmo. Pode parecer piada, mas juro, nunca vi tantos casais felizes nas ruas, se beijando, andando de mãos dadas, sorrindo e amando nesses dias. Até uma amiga, solteira há séculos, engatou um apaixonado namoro. É piada... só pode ser piada.


Pra ser sincera, acho que ando vivendo um período de suspensão: não sei como será o amanhã, não tenho muita vontade de curtir o agora e adoraria voltar atrás. Mas essa fase de impasse vai passar. Tenho certeza.


Mesmo porque acredito que a gente possa receber e dar amor de várias formas enquanto isso: amor de filho, amor de amigos, amor no trabalho e nas relações sociais. Amor em vários formatos, pesos e medidas.


Porém nada substitui um amor que ainda não foi embora, mas teima em querer escorregar pelos dedos, tal como água de cachoeira, que corre para longe da sua nascente, tal como defunto em noite de velório - ele ainda está ali, mas também já não está mais. Um amor que queima dentro da gente, que sobre pelas pernas e atinge lugares que nem sabíamos que existiam. Amor que dá calafrios, amor que faz bater forte o coração. Amor que num ato nos torna bichos, amor que depois, nos leva às nuvens e nos dá paz.


Enfim, como ainda não sou perfeita (e nem quero ser!! Deus me livre disso!!), hoje precisei do "apoio" de um pedaço de um bolo de milho cremoso, já que, na falta de um chocolate, era o que estava mais acessível. Carência na sua forma mais pura!! Porque, tudo o que eu preciso nesse momento, é de amor!!





sábado, 4 de outubro de 2008

São Francisco de Assis

Hoje, dia 4 de outubro, é celebrado o Dia de São Francisco.
Por seu amor à natureza, é mundialmente conhecido como o santo protetor dos animais e do meio ambiente.
Talvez por isso eu tenha tanta admiração por ele, porque também amo os bichos e a natureza.
Por meio de sua lição, entendi que não é o material que rege minha vida, mas sim, a minha compreensão de coisas maiores e mais importantes.
Tanto é que comecei uma pequena coleção de imagens dele.
Minha casa é abençoada por Francisco!! Todos os dias!!



Oração de São Francisco de Assis

Senhor, fazei-me instrumento de vossa paz.
Onde houver ódio, que eu leve o amor; Onde houver ofensa, que eu leve o perdão; Onde houver discórdia, que eu leve a união; Onde houver dúvida, que eu leve a fé; Onde houver erro, que eu leve a verdade; Onde houver desespero, que eu leve a esperança; Onde houver tristeza, que eu leve a alegria; Onde houver trevas, que eu leve a luz.
Ó Mestre, Fazei que eu procure mais Consolar, que ser consolado; compreender, que ser compreendido; amar, que ser amado.
Pois, é dando que se recebe, é perdoando que se é perdoado, e é morrendo que se vive para a vida eterna.

A dor que dói mais


Trancar o dedo numa porta dói.
Bater com o queixo no chão dói.
Torcer o tornozelo dói. Um tapa, um soco, um pontapé, dóem.
Dói bater a cabeça na quina da mesa, dói morder a língua, dói cólica, cárie e pedra no rim. Mas o que mais dói é saudade.

Saudade de um irmão que mora longe. Saudade de uma cachoeira da infância. Saudade do gosto de uma fruta que não se encontra mais. Saudade do pai que já morreu. Saudade de um amigo imaginário que nunca existiu. Saudade de uma cidade. Saudade da gente mesmo, quando se tinha mais audácia e menos cabelos brancos. Dóem essas saudades todas.

Mas a saudade mais dolorida é a saudade de quem se ama. Saudade da pele, do cheiro, dos beijos. Saudade da presença, e até da ausência consentida. Você podia ficar na sala e ele no quarto, sem se verem, mas sabiam-se lá. Você podia ir para o aeroporto e ele para o dentista, mas sabiam-se onde. Você podia ficar o dia sem vê-lo, ele o dia sem vê-la, mas sabiam-se amanhã. Mas quando o amor de um acaba, ao outro sobra uma saudade que ninguém sabe como deter.

Saudade é não saber: não saber mais se ele continua se gripando no inverno; não saber mais se ela continua clareando o cabelo; não saber se ele ainda usa a camisa que você deu; não saber se ela foi na consulta com o dermatologista como prometeu; não saber se ele tem comido frango a passarinho, se ela tem assistido as aulas de inglês, se ele aprendeu a entrar na Internet, se ela aprendeu a estacionar entre dois carros, se ele continua fumando Marlboro, se ela continua preferindo Guaraná, se ele continua sorrindo, se ela continua dançando, se ele continua pescando, se ela continua lhe amando.

Saudade é não saber. Não saber o que fazer com os dias que ficaram mais compridos, não saber como encontrar tarefas que lhe cessem o pensamento, não saber como frear as lágrimas diante de uma música, não saber como vencer a dor de um silêncio que nada preenche.

Saudade é não querer saber: não querer saber se ele está com outra, se ela está feliz, se ele está mais magro, se ela está mais bela. Saudade é nunca mais querer saber de quem se ama, e ainda assim, doer.


(Martha Medeiros)

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

O porquê de escrever


Desde pequena sempre gostei ler e escrever.

Talvez tenha herdado isso de algum parente, talvez isso tenha nascido comigo.

Lembro do meu avô materno, o "Vô Mello", lendo o Estadão - ainda em branco e preto - sentado na poltrona da sala, todo compenetrado.

Aquilo me fascinava.

Paralelamente fui sendo introduzida no mundo das letras por meio de histórias e contos que a minha avó materna, "Vó Nora", me contava.

Cresci gostando disso.

Lembro dos livros que lia na escola, sempre muito antes da professora pedir.

Aliás, era muito engraçado porque, quando a lista de materiais chegava, a primeira coisa que eu ia ver eram quais seriam os livros daquele ano. E lia todos, de uma só vez.

Quando cheguei na fase de ginásio passei a ter (como todo mundo) a matéria 'literatura', com a sorte de contar com uma professora apaixonada pelo tema e muito incentivadora.

Foi ela quem me apresentou Clarice.

Ganhei um livro chamado "Laços de Família" e logos depois, "A hora da estrela".

Posso dizer que isso foi um divisor de águas.

Aquelas palavras, aquelas histórias desabrocharam algo dentro de mim e, tal como uma enchente, trouxeram à tona coisas que nem mesmo eu sabia que guardava.

O amor aos livros e à escrita foram algumas delas.

Passei a escrever poeminhas, historinhas, coisas simples, dignas de adolescente, mas que, embalada por Drummond, Vinícius, Manuel Bandeira (entre outros), faziam muito sentido para mim.

Nessa fase cheguei até a participar de um concurso de poesias, ficando com o honrado 3º lugar.

Veio o colegial e, nessa altura eu já dava aulas para crianças, certa de que o magistério seria minha profissão.

Ledo engano...

Outra professora entrou no meu caminho e me fez perceber que escrever/comunicar não era somente um dom, mas podia ser uma profissão.

Daí fui fazer jornalismo.

E cá estou eu, exercitando o que a profissão certamente exige, porém, com muito mais sensibilidade.

Por isso criei esse espaço: para extravasar tudo o que sinto. E diante de algumas pausas dessa vida, desistir ou mudar o caminho não era a melhor opção. Afinal, "o que é verdadeiramente imoral é ter desistido de si mesmo."

Porque, sinceramente, tem muita coisa que não cabe em mim.

Esse é o porquê de escrever.

E, para homenagear aquela que serviu de start para esse caminho tão seguro, deixo aqui algumas de suas frases/passagens marcantes sobre o ato de escrever.

Obrigada, Clarice!!

Com respeito,

Andréa


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"Escrever é procurar entender, é procurar reproduzir o irreproduzível, é sentir até o último fim o sentimento que permaneceria apenas vago e sufocador. Escrever é também abençoar uma vida que não foi abençoada. "


"Minha liberdade é escrever. A palavra é o meu domínio sobre o mundo."


"Eu escrevo sem esperança de que o que eu escrevo altere qualquer coisa. Não altera em nada... Porque no fundo a gente não está querendo alterar as coisas. A gente está querendo desabrochar de um modo ou de outro... "


"Escrevo porque encontro nisso um prazer que não consigo traduzir. Não sou pretensiosa. Escrevo para mim, para que eu sinta a minha alma falando e cantando, às vezes chorando... "


"Eu só escrevo quando eu quero, eu sou uma amadora e faço questão de continuar a ser amadora. Profissional é aquele que tem uma obrigação consigo mesmo de escrever, ou então em relação ao outro. Agora, eu faço questão de não ser profissional, para manter minha liberdade."