sábado, 27 de junho de 2009

Não ser. E ser.


Já passava das 17h30 quando ela percebeu que nada, absolutamente nada do que ela esperava havia acontecido. O outro não ligara.

De repente começou a sentir uma dor imensa dentro dela, como se um buraco negro estivesse se formando a partir de onde ficava seu coração.

Começou a chorar baixinho, enquanto procurava alguma coisa pra fazer. Um chorinho incontido, sem soluços, só lágrimas.

Olhou em volta e não encontrou nada que pudesse de distrair. Também nem viu as peças de artesanato que precisava terminar, muito menos as outras que nem sequer haviam sido iniciadas. Nada fazia sentido naquele momento. Mesmo porque para fazer arte é fundamental que sua alma esteja em paz, que o artista esteja bem. Afinal, cada peça que ela concluia estava carregada de boas energias.

Para ela, fazer artesanato era mais do que um passa-tempo: era uma forma de expressar tudo de bom que guardava dentro do seu peito.

Mas naquele momento ela estava estranha. Não era um vazio propriamente dito, mas um misto de emoções correndo desencontradas e que a cada choque, provocava um maremoto de sensações.

Sabia que estava fazendo o correto, o racional. Sabia, inclusive, que já estava atrasada com suas decisões.

Mas como gerenciar o coração se ele está tomado pelo outro?

Ela havia chegado a um ponto tão crítico que era capaz de afirmar que amava mais o outro do que a si mesma. E conseguir parar, num ponto desse, já não era tão fácil.

Olhou pra trás e não se viu nos últimos cinco anos. Por onde será que teria andado?

Pois se a vasculhar o computador e, em buscas de pistas, encontrou um registro fotográfico imenso da vida que ela decidira viver. E daí, ao olhar foto por foto, percebeu-se coadjuvante num papel de segunda categoria. O pior de tudo é que ela havia aceitado sem contestar.

Acontece que com o passar dos anos foi percebendo que aquele não era bem o personagem que ela queria e passou a contestar.

Sem êxito contentou-se em seguir ao lado do protagonista da série. Afinal ela era a maior fã do ator principal.

É, a vida dela podia ser comparada a um filme B. Sem grandes emoções, cheia de clichês, nem locações paradisíacas. Não havia figurinista, não havia continuação entre as cenas. Nem como num sitcom, nem como uma novela mexicana, o roteiro era escrito alí, na hora, de acordo com os gostos e humor da estrela principal.

E como não dá pra viver de improvisações, ela cansou.

Roubou a cena num dos momentos mais tensos, e quase ganhou o papel principal.

Quase.

A estrela, temerosa por perder terreno ou admiradores, colocou a parceira de série pra escanteio. E a partir daquele momento ela saia de cena mesmo contra sua vontade.

Nos primeiros dias acreditou que ele viria procurá-la. Ele não era bom no palco sozinho.

Uma semana depois o enredo havia mudado: não tinha mais espaço pra ela nem como assistente de palco.

E ela se viu sozinha. E percebeu que nunca mais teria seu papel de volta. Um papel que nunca quis pra si mesma, e que aceitou por acreditar que um dia brilharia ao lado dele, como num dueto.

Juntou os cacos que encontrou em seu peito eDecidiu procurar outros espaços, mas não sabia nem por onde começar.

Por isso foi olhar as fotos.

E viu, alí, registrado em cliques, diversos trailers de uma linda história de amor. Pena que ela tenha vivido sozinha.

Agora só lhe restava carimbar o FIM e se despir da personagem.

Depois disso, quem sabe, a próxima história seja uma comédia romântica e não um drama.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Clichês, lugar-comum e chavões: pra mim e pra você.


Umberto Eco (em A Misteriosa Chama da Rainha Loana) genialmente escreveu: "Parece que conheço todos os clichês, mas não sei combiná-los de forma crível. Ou talvez essas histórias sejam terríveis e grandiosas justamente porque todos os clichês se entrelaçam de modo inverossímil e ninguém mais pode desembaraçá-los. Mas quando se vive um clichê é como se fosse a primeira vez que acontece e não se sente pudor.



Acabei de ler isso no blog Corporativismo Feminino (http://www.corporativismofeminino.com/).

Aliás, o post todo - http://www.corporativismofeminino.com/2009/06/pimenta-nos-olhos-dos-outros-e-refresco.html - é um tapa na minha cara (tks, Zingara, pela bofetada).

Li, reli, pensei, enxuguei a lágrima do canto do olho esquerdo e suspirei.

Daí eu pude, pela primeira vez, respirar aliviada e dizer pra mim mesma que eu não sou perfeita. E tal a qual a autora, também estou vivendo o viés das minhas próprias opiniões e conselhos que dei pra tanta gente.

Como fazer?

Não sei.

Mas a vontade de recomeçar talvez seja maior do que qualquer tristeza (ou até mesmo a sensação de ter errado).

Hoje olhei que existe vida lá fora.

Foi durante o almoço, com uma companhia pra lá de agradável.

Enquanto a pessoa falava, chovia lá fora. E a água que caiu foi pra lavar a minha alma.

E eu não chorei pela aposta errada que eu fiz.

Decidi pela acertada atitude de recuar uma ou duas casas, como no xadrez.

Eu vi a vida passando lá naquela praça e tive vontade de viver, de acompanhar a vida. Mas eu ainda estou muitos passos atrás, pesada, lotada de sentimentos.

Por isso tive vontade de esvaziar tudo aqui dentro de mim e deixar tal e qual um loft.

Aos poucos as coisas vão voltar aos seus lugares. Eu sei.

Pela primeira vez eu ouvi meus próprios conselhos. Escutei o que eu mesma falava e me impressionei com minhas próprias palavras. E tal como num texto ensaiado à exaustão, percebi que minha cena vinha sendo repetida há quase cinco anos.
E pela primeira vez sai de cena à francesa, deixando o outro representar sozinho. Porque cansei de fazer o papel da Rapunzel sem tranças.

Me despi dos clichês.

Agora eu sou a Andréa.

E só.


segunda-feira, 15 de junho de 2009

Do tempo vem as respostas


Podem chamar de chavão, mas eu adoro a frase: o tempo é o senhor de tudo.

É impressionante como a a ordem das coisas acontece inversamente à nossa vontade na maioria das vezes. E também à nossa revelia, por meio do tempo, vem as respostas. Talvez não a resposta clara, como numa prova dissertativa, mas como delicados toques que só mesmo a maturidade nos proporciona.

Pois é... Nada como o passar dos anos!!

Por isso a importância do tempo que, somente hoje, percebo ser exemplar.

Aliás, a ordem cronológica em que os fatos da nossa vida se desencadeiam é assustadora. E por mais previsível que seja - nascer, crescer, se formar, trabalhar, casar, procriar, morrer - é impossível de ser dominada.

A minha própria vida é um exemplo: aos 15 anos queria ser bailarina do Municipal e ser médica pediatra. Aos 18 já tinha desistido da dança e cursava o magistério. Com 20 estava matriculada em jornalismo, sendo que aos 21 jurava que escreveria no Estadão, na página de política ou economia, e daí ajudaria a mudar o mundo. Hoje, aos quase 35, sou assessora de imprensa há 12 anos. E não me imagino dentro de uma redação de um jornal diário por nada desse planeta.

Agora, seguindo a nossa colega Denise, vou voltar a estudar. Farei faculdade de Letras para voltar a dar aulas. E, assim, tentar ter dias mais tranquilos do que os da semana passada (para quem não sabe dos meus infortúnios, leiam o meu post no blog De Salto Alto e Batom: http://desaltoaltoebatom.blogspot.com/2009/06/tempo-rei.html).

Talvez vocês imaginem que eu sou extremamente volúvel. Mas quem aqui nunca precisou que o tempo esfregasse verdades em sua cara??

Outro exemplo: aos 15, quando eu ainda sonha em ser bailarina e médica, eu não queria ser mãe. Aos 18, essa certeza era quase absoluta, além do que eu cultivava a idéia de ser uma globetrotter, e viver a vida com uma mochila nas costas. Com 24, e depois de um senhor pé na bunda numa véspera de Natal, admiti pra mim mesma que nem casaria, nem teria filhos. Ainda aos 24 engravidei do Lucca, e daí tudo o que eu sonhava foi mudando com o passar dos anos.

Se faltou um planejamento mais correto da minha vida como um todo, eu não sei.

Mas acredito piamente que de circunstâncias são criadas pelo "tempo" para que possamos enxergar caminhos com mais clareza.

Hoje vejo que se tivesse mantido firme os sonhos dos meus 15 anos talvez não tivesse tido a dádiva de ser mãe. E talvez jamais soubesse a delícia de dormir grudada com meu filho numa dessas noites de inverno, sentindo o cheirinho dos seus cabelos. Hoje estou noiva do Zé, que não é o pai do Lucca, mas age como se fosse. E desejo muito que o nosso casamento aconteça logo logo.

Também vi que se tivesse me enfiado numa redação fechada, numa seção de política ou ecomonia, jamais perceberia coisas belas que acontecem do lado de fora, e muito menos conheceria pessoas especiais, que cruzaram meu caminho de assessora de imprensa. Como a vez em que fui filmar numa fazenda de assentados em Ilhéus, na Bahia.

Na ocasião, conheci muita gente maravilhosa, batalhadora, feliz com um pedaço de terra nas mãos e um sonho lindo na cabeça. Sonho este que se concretizou através do tempo. Naquela mesma ocasião, ouvi a frase: "Sonhos só se tornam realidade quando juntamos nossas mãos na mesma tarefa".

Talvez, por ter andado sozinha comigo mesma durante tanto tempo, e por não saber que respostas dependem da nossa maturidade para encará-las, só agora juntei as minhas mãos numa mesma tarefa: ser feliz.

Quanto tempo vou precisar para isso?

Nenhum.

O start é agora.


obs: essa foto foi tirada no mesmo dia em que ouvi a tal frase sobre o sonhos. A mão embaixo da minha é de Jaílson, autor dessa grande verdade. Se quiserem saber mais sobre essa história de Ilhéus, acessem: http://andreamdiniz.blogspot.com/2007/10/tal-da-saudade.html .

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Para quem se foi: Adeus.


Somente hoje percebi que não tínhamos fotos juntas, só nós duas. Também pudera, você vivia implicando comigo porque se achava feia, porque estava sem cabelos, que era para eu esperar você ficar boa e ter cara de saúde pra tirar uma foto.

Não deu tempo.

Tenho comigo uns cliques de momentos oportunos, junto dos meninos, ou de quando a Tia Oswalda e a Marilda vieram de Araçatuba para te visitar. Também fotografei suas orquídeas (como essa que ilustra esse texto) e seus bichos várias vezes. Porém, última vez que te fotografei foi no dia em que a Laura nasceu, 20 de março deste ano.

Sabe, anteontem eu já tinha sentido que você ia mesmo partir. Não sei bem o porquê, mas tinha uma certeza absurda em mim de que era pra eu ir até sua casa e ficar com o Zé. E olha que eu já havia decidido ficar na minha casa, pintando meus artesanatos.

Mas meu coração ficou apertado de repente e eu fui.

E pode parecer encenação, mas eu sonhei com o aviso da sua partida. O telefone tocando e alguém nos avisando do seu adeus.

Dito e feito: domingo, 6h15 da manhã, o telefone toca e vem a notícia de que você, definitivamente, não estava bem. Voamos até o hospital e agüentamos como pudemos as suas quase vinte horas de agonia, dor, tristeza até que alguém te puxou pelas mãos e te levou embora daquele inferno.

Você se foi finalmente... Depois de muitos anos lutando contra uma doença implacável e traiçoeira. E eu assisti tudo - muitas vezes horrorizada, muitas vezes penalizada - de camarote.

Não pense que foi fácil para mim por eu não ser do "seu sangue".

Mas o que eu posso dizer, do fundo do meu coração, é que você foi um marco, um divisor de águas na minha vida. A partir de agora posso resumir minha vida em antes e depois de você.

Acho que você nem imagina, mas seu problema foi o propulsor do meu relacionamento com o Zé. É que no dia que ele me disse que não poderia namorar comigo porque teria que cuidar de você, questionei quem cuidaria dele. E diante de um silêncio, seguido de um abanar negativo de cabeça, respondi: eu cuido. E ele assim aceitou. E assim entrei de vez na sua história.

E você sabe que eu cuidei dele esse tempo todo, com o meu mais verdadeiro amor, e que vou continuar cuidando. Não foi só porque você me pediu isso ontem, mas é porque eu amo muito o Zé.

Quase cinco anos se passaram e eu digo sempre que você tinha mesmo que ter entrado na minha vida. Haviam tantas lições a serem aprendidas...

E eu, como aluna devota, suguei o que pude para me tornar uma pessoa um pouquinho melhor. Aliás, é incrível como a dor nos transforma!

A cada cirurgia, quimioterapia, radioterapia, idas ao médico, exames de sangue, eu sofria um pouquinho. Calada, é claro. Afinal, nessas horas o que eu poderia falar? Porém eu tenho certeza de que você via isso em meus olhos e entendia minha falta de jeito. Também acho engraçado o fato de ter te dado tanto amor, carinho, respeito, assim, tão fácil.

Que é sabido que eu sou solícita, emotiva, mantegona, isso não é segredo para ninguém. Mas, pense: você não era minha parente, ou mãe, ou tia, ou irmã. Você era minha sogra! E por mais que em muitos momentos algumas de nossas diferenças tenham se acentuado, ou sobressaído, digo que você foi a minha grande lição.

Nesse tempo todo nunca quis ganhar nada além da sua afeição, mas através de você conquistei muitas coisas. E entre elas eu listo o Zé, além da fé, da resignação (ou seria resiliência?), e principalmente minha mãe.

É... Precisei topar com você para encontrar minha mãe. E eu te agradeço muito.

Por isso, hoje tenho certeza de que colei grau e fui admitida para uma nova fase.

Vem aí um tempo novo, com novos cuidados, novos desafios.

Pena mesmo que não tiramos nenhuma foto só nós duas. Pena também não ter dado tempo de você me ensinar fazer a famosa torta de frango, ou a rabada. Pena você não ter me mostrado como fazer aquele ponto de tricô, com a lã que eu te dei. E olha que você lembrou disso na quinta-feira.

Pelo menos a abóbora apimentada eu aprendi a fazer. E vai ser meu jantar hoje, em homenagem a você.

Ontem você disse que me deixava o Zé como uma missão. Me desculpe, mas eu vou discordar: você me deixou foi uma jóia rara, que o tempo lapidou criteriosamente, e que hoje eu ostento em meu coração.

Leda, vá com Deus. E que os anjos te acolham junto ao Pai.

Que sua vida eterna seja de muita luz, e que a nossa, aqui na Terra, seja mais doce depois da sua passagem.

Saiba que eu vou guardar cada beijo que você soprou pra mim ontem em meu coração. Pra sempre.

Um abraço, com todo o respeito e carinho da sua nora "mais chata",
Andréa

(PS: essa carta é para a minha sogra que faleceu ontem, aos 61 anos, de câncer. E é um agradecimento pelo resgate da minha fé e pela certeza do amor.)