terça-feira, 22 de dezembro de 2009

E essa parte da minha vida eu chamo de felicidade.


Acabei de assistir o filme A Procura da Felicidade.

Não tinha assistido antes, embora muita gente havia dito que era bonito, emocionante. Não sei, mas na época o título não me chamou a atenção.

Porém, hoje eu precisava mesmo ter visto cada cena, ter ouvido cada palavra. Guardadas as devidas proporções, é claro, aquilo é quase a história da minha vida.

Pra começar, nasci numa família formada às pressas porque minha mãe estava grávida e meu pai, motorista de táxi naquela época, e cheio de brios, resolveu que casar seria, aquela altura, o mais sensato. Nasci seis meses depois do casamento deles.

Três anos e alguns meses mais tarde, em fevereiro de 1978, meu único irmão nascia também, formando de vez a nossa família.

Historinha comum, eu sei, até porque muita gente tem uma igual ou parecida. Mas o que tinha ali que me transporta à história do filme é um pai obstinado em prover, salvar, dar felicidade à sua família. Mais que isso: dar dignidade à sua esposa e educação aos seus filhos por mais difícil que isso pudesse ser.

E assim foi.

Mas não sem antes passarmos por inúmeros percalsos.

Morávamos de aluguel e meu pai nem sempre tinha o valor inteiro para pagar. Lembro bem das vezes que o sr. Peres, o senhorio, ia até lá em casa e conversava com meu pai e aceitava esperar mais uma semana, dez dias, para o pagamento integral. Eu, meu irmão e minha mãe ficávamos no quarto, aguardando a negociação.

A cara de "está tudo bem agora" do meu pai é algo que eu nunca vou esquecer. Simplesmente porque não estava tudo bem, afinal, ele tinha uma semana para conseguir o que não tinha conseguido em um mês.

E assim seguimos até 1983, ano em que sofri aquele grave acidente (relatado num dos primeiros textos desse blog). Nesse tempo meu pai tinha uma lanchonete, muitas dívidas e uma filha acidentada que precisava de um tratamento adequado. Adequado e caro, diga-se de passagem.

Aliás, lembro bem do Natal daquele ano. A festa foi na casa do meu tio Rubinho, irmão mais novo do meu pai.

Todas as pessoas da rua em que ele morava faziam uma grande festa com comidas, bebidas, brinquedos e um Papai Noel que chegava numa Brasília marrom. Nesse ano em específico, eu e meu irmão tivemos um presente apenas para cada um: eu ganhei uma boneca e o Fábio um carrinho (vou scanear a foto e postar aqui. Aliás, essa foi a minha primeira foto depois do acidente). Era o que meu pai podia dar.

Na virada de ano, ao contrário da festança natalina, tínhamos apenas um frango, salada de alface e arroz branco. E nossas vizinhas do andar de baixo abriram uma espumante e nos ofereceram em copos plásticos coloridos.

E isso tudo ficou gravado na minha memória com cores tão vivas que às vezes me assusto e me pego chorando, emocionada, por lembrar de tantos detalhes (ou porque a tal boneca foi a única coisa material que sobrou daquela época).

No ano seguinte meu pai vendeu a lanchonete e partiu para uma área que ele nunca havia trabalhado, mas alguém, em algum momento, resolveu dar uma chance. E ele soubre aproveitar e acho que nunca mais vi meu pai chorar por causa de necessidades materiais (bem, na verdade ele nunca chorou na nossa frente, mas mesmo sendo criança sabia que certas coisas não iam bem e os olhos vermelhos acabam denunciando aquilo que eu supunha).

E assim foi o primeiro passo para conseguirmos escalar a escadaria da felicidade.

Meu pai foi se dedicando, aprendendo, aprimorando, até que apareceu uma nova oportunidade, na mesma área e em outra empresa. Nesse período ele recebeu um certificado de uma importante empresa de auditoria atestando de que ele era o melhor profissional em seu segmento. Bem, pra quem não fez faculdade e nem segundo grau, aquilo era (e acho que ainda é) um verdadeiro diploma.

Dessa empresa para a que ele está hoje foi um pulo e um grande desafio: montar uma equipe e fazer uma indústria gráfica que só tinha máquinas dar lucro. E lá se vão dez anos.

Ele venceu muitos obstáculos ao longo desses 35 anos.

E apesar de tantos nãos, realizou cada sonho. E na próxima quinta-feira ele vai dar uma bela festa de Natal em sua casa. Ele merece.

Daí que eu me pego olhando todo o meu passado e esse exemplo chamado Roberto e me vejo na mesma situação.

As únicas diferenças é que ele não tinha ninguém pra ajudá-lo e eu tenho meu pai. Mas mesmo assim sinto uma insegurança tremenda a cada passo.

E esse ano está sendo a prova cabal de tudo isso: depois de tantas mudanças, tantas reviravoltas, consigo enxergar que 2009 foi um ano estupidamente difícil, mas maravilhosamente bom porque eu superei muitos obstáculos que apareceram (e apesar de achar que vieram todos de uma vez só, tenho certeza de que outros virão em breve).

Também paguei o preço de cada escolha que fiz.

Ainda estou desempregada, vivendo de minguados freelas. Ainda tenho dívidas, ainda tenho muitas dúvidas. Ainda tenho um orgulho besta que me impede de pedir mais ajuda. Ainda tenho a dignidade de saber que não posso viver sozinha. Jamais!

Ainda tenho muitas batalhas para travar e a maioria é comigo mesma. Ainda tenho que crescer, ou como diz meu pai, comer muito arroz com feijão pra ser gente grande.

Em 2009 perdi gente querida pra sempre, perdi gente que amava, perdi chances, oportunidades de trabalho, oportunidades de ficar quieta, oportunidades de me declarar ou de aceitar uma mão estendida ou ainda um acalanto para um coração que batia em descompasso.

Nesse ano que eu resolvi morar sozinha eu descobri a necessidade que eu tenho de estar perto das pessoas que amo, sejam parentes, sejam amigos, assim como também descobri de que definitivamente não gosto do silêncio, da casa vazia, das coisas arrumadas, como se não tivesse mais vida aqui dentro. E pensar que eu tenho filho e bicho...

Também não gosto de dormir sozinha e acordar sozinha naquela cama de casal - descobri que mais do que ser companhia, eu quero ter uma companhia.

E nesses últimos dias eu também passei a ter a certeza de que se eu não trilhar as mesmas estradas virtuosas do meu pai, ainda assim serei vencedora porque, pelo menos, eu tentei com todo o meu coração e esforço. Tanto é que se eu olhar naquele espelho que a Carla (uma amiga mega-querida) vivia me oferecendo pra eu ver a verdadeira Andréa, vou encontrar alguém que sabe o valor de cada tombo, e a delícia de conseguir levantar, com a certeza de que outras situações ainda virão. E eu vou encarar cada uma delas, sempre com aquele meu sorrisão na cara (minha marca registrada).

E se, como no filme eu tivesse que nomear cada fase que passei, sem dúvidas, essa parte toda da minha vida eu chamaria de felicidade.




2 comentários:

Francisco disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Francisco disse...

À Procura da Felicidade!
E quem não está?
Um abraço, amiga!