Potinhos de Nutella acabam. Bons vinhos, aquela cerveja incrível, o prato predileto, o chocolate favorito, férias, filmes, livros. Tudo acaba, tudo é findo.
Relacionamentos também, sejam eles de qualquer espécie. E tal como no caso dos alimentos, muitas vezes azedam antes mesmo de acabar - basta colocar uma colher suja no pote pra correr o risco de perder aquele finzinho delicioso, e ter a (infeliz) surpresa do estrago. Potinhos de Nutella sempre acabam, mas a gente insiste em deixar aquele restinho pra mais mais tarde, pro conforto da alma num momento de necessidade, e não nos damos conta (será?) que isso também acaba. E assim vamos guardando vários potinhos quase vazios pela vida afora.
A gente nasce sabendo que vai morrer. A gente cresce tendo a certeza das finitudes, dos prazos de validade e, ainda assim, insiste, dentro de um egoísmo absurdo, em prolongar o que não tem mais jeito. Rezamos para Deus manter conosco pessoas com doenças em estágios terminais. Rezamos para que o chefe nos mantenha naquele emprego insuportável, que suga nossa vida e nos joga no limbo mais profundo do poço da baixa autoestima profissional. Rezamos para que o outro não vá embora mesmo estando infeliz ao nosso lado e fazendo de nossos dias monótonas paisagens cinza. Rezamos e não aceitamos o fim, mesmo diante da certeza do fim. Como por fim aquilo que já nos deu tanto prazer?
E, ao contrário do que se pensa, isso não é amor, é apego, é egoísmo puro e medo simples.
Esse é o ponto de quebra da questão: meter o dedo lá no fundo do pote e tirar o melhor dali ou deixar estragar só pra dizer que ainda tem um resto?
A gente sempre esquece que dá pra buscar outro, que dá pra ter coisa melhor ou maior. E daí, diante da ansiedade do fim e do medo, opta errado, e vive infeliz pro resto da vida com a escolha.
Há algum tempo, desde que me permiti viver minha metamorfose, venho aprendendo a lidar com os finais - alguns felizes, outros nem tanto, mas todos essenciais para que haja renovação de ciclos. Dizer não para jobs duvidosos, fechar portas para amizades unilaterais, me sabotar cada vez menos (até zerar essa conta), não ser o que os outros querem, mas viver minha minha essência em si, e ir cortando relacionamentos abusivos, (de novo) sejam eles de qualquer natureza, fazem parte desse aprendizado,
Saber viver o prazer do fim é sinal de maturidade. É como beber até a última gota do vinho e ficar com as bochechas vermelhas e o riso frouxo. É alcançar com o dedo aquele restinho da Nutella lá no fim do pote e preencher a alma de conforto com tão pouco e seguir em frente,
É saber que, para todas as coisas que acabam, outras começam. Basta a gente não deixar estragar.
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