terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Muito mais do que aquilo.


Há dias ele vinha insistindo para vê-la, e ela, sempre tão solícita, dava sugestões de datas, horários e locais.

Mas acontece que o moço trabalhava muito. Principalmente fora da cidade. Nunca tinha tempo suficiente para encontrá-la. E com isso os dias foram passando.

Mas ele não desistia e ligava quase todos os dias para atentá-la, seduzi-la. E ela ficava lá, sozinha, devaneando como seria bom.

Depois de um tempo, ela já estava convencida que era namorada dele.

Resolveu que não ficaria com mais ninguém, fecharia as portas para oportunidades e esperaria o momento certo para tê-lo, finalmente, em seus braços.

Acontece que, por mais que seu coração tivesse dono, seu corpo dava sinais de vida. E com o tempo, isso foi aumentando.

Pra ajudar era verão: saias e decotes evidenciavam partes que estavam guardadas para um certo moço. E ela era bonita. Não tinha aquela beleza vulgar, nem se vestia como tal, mas as roupas acusavam um corpo "à brasileira". E isso chamava a atenção. Principalmente de um certo rapaz que assoviava todos os dias quando ela passava, a caminho de seu trabalho.

No começo isso a deixava enfurecida. Sujeitinho safado, pensava enquanto sua memória puxava pelas coisas gostosas que ouvira do dia anterior, durante o telefonema de seu amado.

Ah! esse moço que ela tanto esperava realmente fazia seus pés sairem do chão, a cabeça dar voltas. Em noites mais inspiradas, ele promovia horas de volúpia ao telefone. Era avassalador para ela, que aprendeu, entre outras coisas, a se entregar ao prazer solitário.

E para seu desespero, no dia seguinte ainda tinha aquele outro moço, tão inconveniente.

Meses se passaram. Exatamente oito meses e ela esteve com seu amado apenas cinco ou seis vezes, sendo que nunca chegaram às vias de fato.

Até que um dia ele a pediu em casamento. Disse que estava voltando de vez pra cidade e que iriam jantar juntos. Pediu para que ela escolhesse o restaurante e marcasse o horário.

O dia chegou e quase se arrastou. Teve frio, calafrio, dor de barriga, ficou elétrica, ansiosa, mas finalmente chegara a hora.

Foi para o local combinado - um restaurante charmoso pertinho de seu escritório - e no meio do caminho encontrou o jovem que assoviava para ela. Ele a abordou e ela entrou em pânico!

Já pensou se seu amado passasse por alí e visse aqui? O noivado certamente iria por água abaixo!

Mas, ao contrário do que esperava, não ouviu nenhum galanteio barato. O moço foi educado e muito claro. Disse que tinha verdadeira admiração por ela, que não só a achava bonita (por isso os assovios), mas como também via nela uma aura de lealdade, fiedelidade. Porém, como nunca tinha visto com ninguém, deduziu que era solteira, sozinha. E isso o instigava.

Ela se desvencilhou dele, sem ao menos perguntor o nome do moço, dizendo que tinha um compromisso e saiu correndo dalí.

Chegou ao restaurante e pediu uma água. Depois outra e daí um suco de maracujá. Ele estava atrasado e ela, nervosa.

As horas passaram e ela insistia no telefone celular, que só chamava.

Pediu a conta e saiu dali triste, cabisbaixa.

Chamou um táxi, acenando para uma dos carros que estava no ponto em frente ao restaurante e, em meio a lágrimas entrou no carro e nem percebeu que o motorista lhe estendia um lenço.

Soluçando pediu que a levasse para casa. Durante o caminho, que parecia muito mais longo do que o habitual, foi despejando alí toda sua raiva, sua frustração, sua indignação. E a cada lencinho estendido, assoava o nariz e continuava a narrar sua saga.

Até que enxugou os olhos e pode perceber, pelo espelho retrovisor, que o motorista era o tal moço que assoviava para ela.

Num primeiro momento quis morrer de tanta vergonha. Mas depois teve uma idéia: pediu o celular dele e ligou, assim o amado não reconheceria o número e ela poderia tirar satisfações.

Aquela altura dos acontecimentos ela já não se surpreenderia com mais nada. Muito menos com suas atitudes.

E assim o fez: pediu o celular e quando ainda dava sinal de chamada, o motorista tirou o aparelho de suas mãos, ligou o viva-voz e, ao perceber que o outro havia atendido, improvisou um sotaque caipira e disparou:

- Ô cara, cadê você? Que balhureira é essa?, perguntou ao ouvir sons de risadas e música.

E eis que o outro respondeu, com voz já embriagada:

- Tô na despedida de solteiro do João. Vem pra cá você também.

A ligação caiu nesse momento.

Silêncio dentro do carro por alguns minutos até que ele pergunta:

- Pra onde, moça?

- Pra casa... pra sua casa. Agora!, ordenou se recompondo no banco traseiro. E emendou:

- Preciso de muito mais do que aquilo.

Ela acordou no dia seguinte numa cama que não era a sua. Mas com o gosto, o gozo e a certeza de que ela precisava, também, muito mais do que tudo aquilo. Outra vez.


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